quarta-feira, 29 de abril de 2009

Carta ao espelho.

salve!!

Como tem passado? Espero que bem. Este semestre tenho pensado bastante sobre minhas escolhas, gostos, inclinações e estou conseguindo, na medida do [im]possível, estabelecer conexões entre minhas aptidões e gostos, a fim de transformar em algo. Algo que seja mais que visual. Algo em que eu possa realizar de dentro-pra-fora, com o propósito de mostrar[-me] livremente[ou quase] ao mundo e causar-lhe afetações. Talvez o meu contato com o teatro esteja me influenciando durante esse tempo todo. Ou não. É difícil assumir esse compromisso, mas tenho que tentar. Me falta certa lucidez ao fazer escolhas. Não sou bom nisso. Em fazer escolhas. Odeio a idéia de ter que me prender a uma escolha. Sou instável e essa instabilidade que é igual a mim, deixa-me sem forma. E é assim que me vejo: Algo sem forma. Gosto disso porque, já que não tenho forma definida, posso, na hora que me convir, assumir a forma que eu quiser e depois, desmanchar isso tudo. Ando vendo filmes, assistindo peças de teatro, exposições, ouvindo músicas...e acabei lembrando de uma coisa que você havia me falado, que eu tenho um traço expressionista.
No primeiro momento, não tinha muito me agradado com isso, de ser “expressionista”. Minha associação direta da palavra foi a Van Gogh e, confesso, por não conhecer a sua história e tampouco sua arte, não gostava dele. Tinha implicância com coisas que não fossem brasileiras, para me inspirar, guiar ou qualquer coisa. Prezo por certa brasilidade... Andei revendo os meus trabalhos e consegui enxergar alguma coisa. Meus trabalhos, os traços, parecem ser feitos com pressa, com vontade, desespero. Não sei, parece-me, agora, que eu quis falar alguma coisa e faltou a “boca” para fazê-lo. Aí, lembrei de Van Gogh, Beethoven, dos traços fortes e a “desconstrução” da forma de Picasso, Ivan Serpa, Bacon; dos textos de uma dramaturga chamada Sarah Kanne, do também do dramaturgo Peter Brook e do escritor Anton Tchekhov.
É nisso tudo que estou mergulhado agora. Não deixei de praticar. Ando criando, experimentando, tentando me achar nisso tudo.Tentando achar meu “estilo”.
Você sabe me dizer se há quem trabalhe, pesquise o expressionismo ou a arte de Picasso ou algum desses que eu mencionei? Gostaria de estudá-los mais profundamente.

Um abraço.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Um fragmento que, não propriamente, fará parte da História.

-... parece-me que há um delírio... como em uma febre alta, um estado que transcende a lucidez, uma espécie de sonho, confuso.
Pega a caneca de louça vermelha. Põe o café.Toma todo o café da garrafa, lê sem atenção a correspondência que está há três dias em cima da mesa da cozinha.


De repente, uma fração de lucidez e possível indignação sobre a vida
e ...
a sensação de que tudo que foi feito não surtiu efeito,
em vão...
decepção! por não ter as coisas e pessoas do modo que imagina e espera. Relê a correspondência. Era uma carta da Nina dizendo que ficaria por mais um semestre em Madri porque era linda e porque tinham renovado o contrato dela por mais seis meses.

- Merda!

Depois de uns minutos disse para si, mas olhando para a carta:

- Que bom que estão gostando do seu trabalho. Você tem talento...talento para me deixar puto nesse buraco. E ainda vamos nos casar...


Indignou-se com a capacidade de tentar cobrir a carne viva, exposta da vida real com fantasias, sonhos. Quando se depara com o real - que choca-, o peito bate com disritmia...

"... tudo aqui é muito lindo, Carlos. Você precisa vir pra Madri. As coisas acontecem aqui. Sabe que nem sinto saudades do Brasil?..."

O incômodo, a dor que é a própria vida. Aqui, Carlos deixa de sonhar:

- O dia, lá fora, no mundo, está tão bonito. Todos felizes com a chegada do circo, pensou. Era como se o amor tivesse chegado com o domingo. O domingo que parece o último dia. Último, solitário, frio, vazio, humano. - É o domingo. Disse para si.
- O meu domingo chove... o do resto do mundo, não.E em Madri...
...
Confusão mental. E em um surto causado pela dor: Delírio. Mais. Pega a faca e, impulsivamente, faz ponta num toco de lápis esquecido na fruteira com três maçãs, uma banana apodrecida, uma laranja mofada, papéis velhos e cigarros apagados:

Com minhas tolas incertezas – tantas
- teci a mortalha do corpo em mim ainda vivo.
O corpo não comigo é sopro
Que se pode pegar com mãos não.
Vida fio de navalha, corta corpo vil e sangra.
Esvaiu-se alma, riso resto.
Acabou.

Confuso e indignado com o próprio ser acaba por matar a poesia que nele também é viva, parte dele, com a existência da verdade – mesmo ela sendo difícil de se ver - . Põe a poesia como um entorpecente do ser poeta, que de nada vale, a poesia. A não ser para embriagar a alma em farrapos...

Vem à tona todos os sentidos misturados, como se fossem eles - os sentimentos e eles, propriamente - um só. Sinestesia. Senta em frente à máquina de escrever, que fica numa mesinha de madeira maciça em frente a janela e escreve, de pés descalços, sem camisa, em vermelho:

- Por quê?

Auto pergunta-se, depois de tanto sentir.
já entorpecido de si, ameniza a própria dor de ser. Bebe café. A alma,lágrima.
Eis o ponto cego: a dimensão de dentro do próprio ser. Ele, dentro, que é a própria confusão, o acidente de si mesmo.
a vida esvaindo-se, o sol apagado pela boca do anjo que o engole e leva: leva a luz e deixa o vazio - de novo -, o frio, o anti-ninho. A morte.
despede-se da vida, de si mesmo afogado nas suas próprias verdades...na sua própria dor, na sua própria vida.
Docemente. Mais um dia, a vida o matou...

Passam-se sete meses

: agora, que não sou mais um feto, que não tenho a proteção de um ventre e todos os cuidados maternos intra-uterinos, sou impelido a respirar um ar pesado e sujo, de um mundo torpe e caótico que também ajudei a fazer. Um mundo que odeio com tanto amor. Um mundo que antes de me deixar vivo, me mata, se não me movo. É preciso sair do útero porque ele te trai. Se ficamos por pouco tempo, nos tiram a maturidade e somos cuspidos faltando parte. Se ficamos por mais tempo, nos cospem além de maduros.Como frutas mofadas e podres. A única possibilidade humana de ser vivo é ficar fora do útero e deixar de ser completo. É machucar-se, ter faltas, vazios, desejos, risos. E doer. Por isso, decidiu que não poderia mais ficar dentro de casa nem mais um minuto.
Do jeito que estava foi porta a fora.

-Eu mesmo cuspi-me do útero-casa, assim. E com o instinto de animal que sou, andei até achar o mar. E ali estávamos os três:
o mar, o mundo, Eu e mais ninguém.
senti o infinito tão intensamente solto que invejei mais uma vez(porque invejava sempre!)o mundo, o mar e o universo. Isso é uma injustiça maior do que tudo.
Eu não quero acabar um dia. Não.

Carlos ficou ali, entre o mar e o mundo por alguns minutos. Até que o mar urrou para ele em forma de ressaca, como se estivesse expulsando-o dali, como se o dessesse:

- Vá embora! Saia! Não se aproxime!

Carlos não se intimidou com o mar e urrou pra ele também. Agora, eram dois leões e o mundo.
Carlos atacou o mar de peito aberto, e como toda fera tem presas, o mar mastigou Carlos inteiro e Carlos, Carlos batia no mar, dava-lhe patadas, urrava: mais. Neste ínterim, o mundo estava lá e não fazia nada porque não sabia fazer nada além de ser mundo.
Mar é bicho brabo e Carlos sabia disso. Só que Carlos é bicho traiçoeiro. Pior que isso, é bicho-homem. Mas depois de tanto um bater no outro e outro bater no um, suas feridas vazaram e o líquido quente de Carlos e o líquido gelado do mar se misturaram e formaram uma pasta quase homogênea. O sangue do mundo.
O bicho-mar, cansado, cuspiu o bicho-Carlos no mesmo instante em que ele cuspira-se do mar. Saiu da boca do mar. Peito aberto e arranhado, seus cabelos lambidos. Cheio até a alma de areia. Seu corpo e todo resto lavado de água, sal e sangue.

-Andei devagar até a areia e parei. De pé. De frente pro mar. Como antes.

Sentiu a arrebatadora ventania fria dos dias de agosto. Percebeu que seu corpo, quando lutava com o bicho-mar e consigo, era verão. Fora do mar, seu corpo era inverno como o mês de agosto.
Sentiu frio de arrepiar a nuca, escamar a pele, bater o queixo e doer as articulações:
estava feliz.

Após reconhecer a natureza em si e reconhecer-se nela, foi. Andou pelo mundo, que no final das contas, também era ele mesmo.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Que mistério tem Clarice?



,e ficou sozinho no salão repleto de gavetas com partes da vida dela. A irmã, de cabelos curtos, novos, escarlate, deixava-o para sentir sozinho, com ele mesmo. O salão cheio de pessoas reverberou todo o som por elas produzido. Quase uma gritaria.
No momento, por um momento, suportou. Mas, o incômodo comeu a tolerância e o tomou de todo. Sentiu nervoso de ver e sentir tanta gente. Angústia de ouvir o bater das gavetas, como se todos procurassem desesperadamente por algo. O que seria?
Desistiu.
Saiu tensamente angustiado do salão.
Foi vê-la falar. Migrou, agora, para um estado de calma e quase paz. Ela rígida, com o sotaque, fazia-se - quase - difícil de ser compreendida. Em, sua aparição plana, para ele, uma espécie de epifania. Viu que ela tinha sotaque e admirou-se. O som da voz. A própria voz. Ela inteira: apresentava-se por detrás de uma espessa camada enigmática. Ela. Que mistério tem?
E lendo suas palavras, agora entende, não lê somente um grupamento de letras que formam palavras, que formam frases, que, por fim (?) formam idéias. Não. Lendo suas palavras ele descobre que,
na verdade lê ela mesma. Em forma de uma literatura que dói. Porque é a própria vida. Quase fabulada. Ela, que mistério tem? Todos.
Nenhum.
Ela: o próprio mistério. Ela:
universo.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

divagações...divagações...


O relógio me prende a um estado contínuo de estar. Mas é que sou e ponto. E ponto? Não. Além de ser, estou. Sim! Estou sendo. E estar sendo é muita coisa. Isto é bom. Mantém vivo, tudo. Em absoluto. O dom de existir dado pelas dores e pelas não-dores do sentir revigora o corpo [gasto pelo mesmo tempo] que luta consigo mesmo na busca da auto-afirmação de ser o que é e o que se é e: corpo vivo.
Então, se sou corpo vivo, devo ter por necessidade - se não tenho, necessito necessitar - sentir a dor que é a condição de estar vivo. Sentir o todo no tudo de mim: o mundo.O enfrentamento volátil entre o eu - mundo e o outro - mundo para que eu não seja capaz somente de ver-me. Mas ver o outro, causar-lhe afetações e sentir-me. Para ser livre. Mas, o que significa? Quanto a Liberdade, não sei e por isso penso. Tento. Descubro que pensar é difícil porque te exige [antes mesmo de pensar] o pensar em pensar. Ou seja, antes de pensar a coisa, pensar em pensar a coisa. Talvez isto justifique a ausência de prática do pensamento no mundo, transferindo as energias para o falar. Fala-se muito e não se pensa com o mesmo peso. A idéia que antes transitava, agora se mantém inerte em seu estado de Ser-para-sempre. E o Homem apodrece antes mesmo de germinar. Mas tudo isso porque ele é livre, porque pensa, ou melhor, acha que pensa que sabe o que é Liberdade. Prefiro não saber até depois de morto - não só de corpo -. Deixa a vida mais instigante e mais humanamente crua. Sem “ismos”, rótulos e enquadramentos. Disforme.

Como eu.
[080908]

quarta-feira, 1 de abril de 2009

antítese



Enquanto uns prometem a "esperança", outros dão o choque...de ordem.

Enfim, formada!

Afirmativas:

Eu deixei o pássaro voar.
Eu bati as asas do pássaro.
Obriguei o pássaro a voar e
prendi-me na gaiola.
Pára todas as minhas
funções vitais com apenas
tua presença morena.
Pára todo meu pensamento
com apenas
teu sorriso sereno.
Pára toda minha vida
com apenas
tua partida sem volta.

E volta(!)?