O rapaz, casmurro, anda apressado, passos duros e retos. Seu corpo, uma
curva que aponta para o chão. Há tempos que observo da janela este rapaz, de
barba, rosto de rapaz jovem, barba de homem, nariz pontudo, fino, traços finos.
Um rapaz bonito. Seu rosto, de feições bonitas, delicadamente desenhadas é
intacto. Rosto de estátua, imóvel, duro. Rosto duro deste rapaz. Uma beleza
dura: este rapaz.
Ele passa pelas ruas sem olhar, sem se olhar. Há tempos que observo da
janela. Fico pensando no que pode pensar este rapaz. Com o que sonha este
rapaz. Um mistério.
Os dias, meses,
anos passam e há tempos que observo da janela este rapaz. De barba. Rosto de
rapaz não mais tão jovem. Rosto marcado, olhar fundo, rugas cravadas numa pele
áspera. Rapaz de uma feiura dura: este rapaz.
Ele passa pelas ruas sem olhar, sem ninguém olhar. Há tempos que observo
da janela. Fico pensando no que já não pode pensar este rapaz. Com o que já não
sonha este rapaz. Um estéril.
Os dias, meses, anos passam e há tempos que observo da janela este rapaz.
O rapaz, casmurro, anda apressado, passos duros e retos. Até que um dia,
este rapaz para. Sua cabeça feia se projeta para a janela. Seus olhos fundos
olham. Olham para dentro da janela. Há tempos que observo da janela este rapaz.
Desta janela dura, de talhos finos. Desta janela bonita, de traços bonitos,
delicadamente desenhadas. Intacta. Imóvel. Dura. Meu olhar é duro desta janela.
Um olhar duro.
O rapaz olha. Eu olho o rapaz porque há tempos que observo da janela este
rapaz. E do vidro da janela observo. E foi naquele instante que aquele rapaz,
que há tempos observo da janela, se olhou, depois de dias, meses, anos.